A emissora de rádio, importante veículo de comunicação, encontra na internet um grandioso modo de transmissão que propõe novas experiências e novas estratégias de comunicação, especialmente entre locutor e o público, cada vez mais multimidiáticos. O objetivo deste trabalho é analisar o contexto das convergências digitais e midiáticas, como um período complexo, cheio de desafios, exigências e mas de muitas oportunidades. Neste contexto de oportunidades, a rádio, embora conservando a sua identidade sonora, interage com o sistema de convergência e, encontra nele, um aspecto positivo, isto é, a rádio permanecendo sendo um meio friendly, amigo, interage com as novas mídias, acompanhando as tendências inovadoras do seu público cada mais exigente e presente nas mais distintas localidades geográficas do mundo.
Palavras-chave: Convergência digital; Internet; Rádio; Interação.
Desde os primórdios da sua invenção e experimento, em 1895, pelo italiano Gugliermo Marconi, a rádio, importante veículo de comunicação, caracteriza-se unicamente pelo uso do som que é transmitido à distância, através de ondas eletromagnéticas, por um transmissor de sinais sonoros e captados pelos aparelhos radiofônicos. Curiosamente, cem anos após sua invenção, em 1995, com o advento da tecnologia digital streaming², [1] quer dizer fluxo, a rádio ampliou a sua capacidade de transmissão e de recepção, gerando uma nova forma de interação e comunicação com os diversos atores presentes no campo radiofônico. Os primeiros softwares streaming, lançados no mercado com uma grande difusão, nos anos 90, foram: Real Audio Player do Progressivo Real Networt e Windows Media Player da Microsoft.
Sem sombra de dúvida, se formos analisar o DNA do meio de comunicação “rádio”, reforçaremos a tese do espanhol Mariano Cebrián Herreros de que “a rádio é puramente som, ou seja, a rádio conserva a sua característica primordial, o áudio, todavia não ignora o campo que se abre diante do das novas tecnologias digitais da comunicação.” (HERREROS, 2009: 25). A rádio, por conseguinte, vem interagindo e se adaptando à linguagem e ao novo processo da convergência multimídia sem perder a sua identidade – o áudio -, desencadeando novas modalidades e possibilidades neste fecundo cenário digital, onde a sua audiência se amplia e se diversificada.
O percurso reflexivo da rádio e sua interação com a linguagem multimídia, presente na convergência digital, toma como ponto de partida a própria compreensão do significado do termo “multimídia”. No campo tecnológico, segundo Manuel Area, o termo “multimídia” é compreendido como “um dispositivo ou um conjunto de dispositivos (software ou hardware) que permite integrar diversos modelos de informação, sejam eles: textual, gráfico, auditivo e icônico.” (AREA, 2001: 415). Catarina Cangià reforça que “a combinação das mídias tem como objetivo estimular os nossos sentidos, […] provocando muita sensação, estimulando os olhos, os ouvidos, as pontas dos dedos e, em especial, a cabeça.” (CANGIÀ, 2013: 41). Por outro lado, se considerarmos o termo “mídia”, como meio - não somente no sentido tecnológico, mas como uma forma de linguagem ou de se comunicar -, e “multimídia” como diversas formas de linguagem ou meios que utilizamos para nos comunicar, podemos propor que, a comunicação multimídia não é nova e a raiz do seu significado não estar no advento da convergência digital, e sim, na própria expressão corporal do ser humano, através dos seus sentidos e das várias formas de comunicação e interação com o mundo.
Assim quando nos comunicamos ou nos relacionamos com os outros, nós, seres humanos, expressamo-nos através de duas áreas fundamentais da comunicação: a comunicação verbal (palavra, língua materna, outros idiomas, sons culturais, etc) e a comunicação não verbal (visão, audição, tato, olfato e paladar). Neste sentido, a convergência midiática ou das mídias que se desenvolve a cada momento, é de certa forma, um reflexo, ou melhor, um prolongamento – tecnológico – da comunicação midiática humana, como afirma Marshall McLuhan: “Os meios, como extensões de nossos sentidos, estabelecem novos índices relacionais, não apenas entre os nossos sentidos particulares, como também entre si, na medida em que se inter-relacionam”. (MCLUHAN, 2007: 72). Esta analogia entre os sentidos humanos e as mídias digitais tem sido refletido também pelo pesquisador Tay Vaughan: “[...] A convergência digital das mídias tem sido uma experiência, de certa forma, da própria expressão comunicativa do ser humano há milhares de anos atrás. ” (VAUGHAN, 2014: 16). Deste modo, quando nós nos comunicamos com o mundo, além das palavras, da entonação, da pronúncia e do ritmo da nossa conversação, nós nos expressamos e nos comunicamos por meio dos nossos gestos, movimentos, vestimentas, cores, posicionamentos, comportamentos, características etc. A nossa comunicação é, por conseguinte, uma combinação de vários meios ou linguagens humanas.
Ao aplicarmos a linguagem “das multimídias humanas” ao campo tecnológico, percebemos que, no processo de convergência das mídias eletrônicas e telemáticas, existe uma tendência em aproximar ou identificá-las, cada vez mais, à comunicação humana. Para David Henry, no caso da rádio, tradicionalmente conhecido como um meio de comunicação sonoro e friendly, ou seja, “amigo, companheiro”, “o processo de convergência incorporou novas linguagens e formas de comunicação, ampliando a relação de amizade com o seu público.” (HENRY, 2002: 169). Herreros (2009:24) aponta para os vários fatores que influenciaram e continuam influenciando tal convergência midiática da rádio: “[…] assistimos à convergência da rádio tradicional com as inovações de técnicas e de multimídia, com tendências à inovação de linguagens, dos conteúdos e do próprio modelo radiofônico”. Na linha desse pensamento, Herreros ainda pontua que, do ponto de vista político-econômico, o processo que estimula tal convergência das mídias é estimulado fortemente pelos fatores tecnológicos e empresariais,
A convergência tecnológica-comunicativa dá origem aos serviços das redes interativas e multimidiáticas. Até então, o telefone foi o grande aliado da rádio para a produção, conexões entre emissoras, correspondentes, emissão em cadeia e participação dos ouvintes. Na convergência empresarial, as alianças, as fusões e as compras de ações tendem a formar empresas de comunicação com diversificação de negócios por mídias separados, vinculados e convergentes. Esta convergência tende a criar poderes multinacionais. (HERREROS, 2009, p. 25-26).
Todavia, se fizermos um paralelo com o advento das novas mídias, perceberemos que, no desenrolar da convergência digital, a rádio não perdeu sua autonomia, mas, de certa forma, prosperou, integrando-se aos diversos formatos de mídias. Segundo Heródoto Barbero e Paulo Rodolfo de Lima,
Se por um lado, a rádio sofre uma enorme transformação interna, por outro, ela absorve os processos técnicos e comunicativos gerais com intuito de obter um maior aproveitamento das mídias em favor do seu novo modo de comunicar-se. (BARBERO e DE LIMA, 2003, p. 34)
A rádio transforma e amplia a sua interação com o público, oferecendo-o, além do áudio, telefone, carta, novos serviços telemáticos, entre eles: e-mails, arquivos sonoros, imagens e novas plataformas digitais, etc. Este ponto de vista é reforçado por José Luis Orihuela, ao afirma que “a evolução das tecnologias da informação mostra que a dinâmica operada entre velhos e novos mídias é de complementariedade e não de substituição. “ (ORIHUELA, In: Chasqui, n. 77, 2002: 11).
No processo de convergência nas emissoras radiofônicas, a internet desempenha um papel fundamental. A convergência digital dos meios de comunicação de massa para o formato multimídia é uma realidade que ganha espaço com as inovações midiáticas. A rádio digital, a web rádio e a transmissão via internet, ao se abrir às novas tecnologias e à internet, possibilitam a criação dos arquivos sonoros, textuais, fotográficos que são disponibilizados nas plataformas aos seus usuários, ampliando, assim, o seu canal de comunicação com os ouvintes. Esta ampliação trouxe para este importante veículo de comunicação, novos formatos, novas programações, novos modelos comunicativos, novas interações, novas formas de transmissões, em especial, a transmissão via internet, escrevendo então um novo capítulo na História do Rádio e da Era digital. Assim, beneficiada pela convergência tecnológica das mídias, e em resposta às exigências desta nova Era, surge, em vista disso, a transmissão via rede digital das ondas eletromagnéticas – rádio via internet³ -[2] como um novo espaço radiofônico interativo que cresce velozmente.
Desta maneira, é uma realidade que não podemos ignorar, mas aprender e conhecer o potencial inovador, interativo e comunicativo desta poderosa ferramenta. É um tempo novo! Pois, plugada e transmitindo via internet, a rádio adquire novas qualidades e novas características que vão além de sua característica primordial, o sonoro. Desabrocham novas características, entre elas temos: a transmissão que ultrapassa às fronteiras territoriais de uma cidade, de um estado, de um país ou de um continente, a homepage, a personalização do fluxo sonoro, os serviços on line e on demand, a ampla audiência e os novos portfolios publicitários. Para Mellina Cavallaro,
A internet, além de possibilitar a fruição sonora, implementou a rádio com a parte visual que nunca teve [...] através da sua homepage, dos vídeos e dos áudios arquivados no site, da webcam instalada no interior do estúdio, das fotos dos programas e dos eventos, etc. (CAVALLARO, 1998, p. 64)
Uma das facilidades que a internet proporcionou à transmissão radiofônica foi que, diferentemente de uma transmissão feita por ondas eletromagnéticas que necessita de uma licença da Anatel para funcionar e transmitir sua programação, para transmitir sua programação em rede, como sustenta o italiano Enrico Menduni,
A emissora não necessita de uma licença, frequência ou autorização, evitando de certa forma as complicações burocráticas que muitas vezes limitam à atuação dos meios de comunicação. [...] E, além disso, é possível ouvir a emissora - ao vivo - em qualquer parte do mundo a baixo custo. (MENDUNI, 2006, p. 87)
É fascinante constatar o potencial da rede telemática no campo radiofônico: amplia sua audiência sem precisar aumentar sua frequência de radiodifusão. Assim, se num primeiro momento, a rádio transmitida via internet utilizava o streaming somente para reproduzir, na rede, a mesma programação que se transmitia pelas ondas hertzianas. Aos poucos, os produtores radiofônicos perceberam a oportunidade e a potencialidade que a página da emissora, na internet, proporcionava-lhes incorporar serviços paralelos de informação e ampliação de dados sobre a veiculação dos programas sonoros. De modo que, suas peculiaridades, além de possibilitar um novo ambiente comunicativo, despertam também os interesses do mercado publicitário e do público conectado.
As inovações tecnológicas provocaram discussões entre os estudiosos da mídia, entre eles, Mariano Herreros que, ao analisar a convergência digital e multimídia, acentua o debate sobre este novo modo de transmitir e fazer rádio. Segundo esse autor,
A rádio via internet é uma outra coisa diferente à rádio. Não se trata da rádio via internet senão de uma informação sonora acompanhada de outros elementos paralelos escritos e visuais com capacidades de conexões, de navegação, de ruptura do sincronismo deixando o usuário livre para acessá-la quando quiser. (HERREROS, 2009, p. 21)
Esta visão, todavia, não impede a interação e a adesão dos ouvintes a este novo modo de transmissão, pois na opinião de Menduni, “os principais estudos do setor sobre a audiência confirmam que, os usuários on line nutrem muito mais expectativas em relação a rádio via internet do que em relação à transmissão do sinal via sinais radiofônicos [...].” (2006: 15). Em geral, podemos afirmar que, a adoção do novo canal de transmissão superou a fase experimental. Já é uma realidade! Constata-se que, um grande número de emissoras de rádio estão presentes neste espaço interativo e oferecem diversos serviços ao seu público, como enfatiza o próprio Menduni, “é um público que se mostra cada vez mais exigente no consumo desses serviços. [...] a nova rádio terá que desenvolver uma grande e excelente quantidade de serviços se quiser que os internautas-ouvintes estejam conectados.” (2006: 13).
Porquanto, se o público é cada vez mais exigente, e demanda por uma programação multimídia, Herreros nos lembra que “as rádios necessitam, além da parte técnica, preparar e capacitar os seus profissionais para esta nova fase radiofônica.” (2009: 67), a qual gera outras modalidades comunicativas sonoras, especialmente as orientadas à interatividade, às correlações sonoras e à busca de dados de informações vinculadas ou não à emissão simultânea dos documentos sonoros.
Neste novo campo de comunicação, a criatividade dos profissionais radiofônicos deverá ser cada vez mais dinâmica e inovadora acompanhando concomitantemente os processos sociais e assumindo o papel de ser um elemento participante e importante neste processo. Para Hugo Vela (VELA, in: Intercom, 2002), esses profissionais deverão, logo, ser capacitados para atender a demanda do público que se encontra na sua área de abrangência territorial e daquele que se encontra em regiões distantes. Entre as principais características deste novo formato radiofônico - dinâmico e competitivo - que interage com seus diversos públicos e o novo mercado publicitário e musical, destacam-se: a personalização do fluxo sonoro, homepage, serviços, novo perfil da audiência ou nova comunidade, mobilidade, publicidade e conexão.
Em relação à personalização do fluxo sonoro, é pertinente recordar que, normalmente uma transmissão radiofônica convencional é acompanhada pelos ouvintes que compartilham - em tempo único, sincrónico - os conteúdos sonoros recebidos pelos aparelhos de rádio, tornando-a um instrumento de socialização, ou seja, ao mesmo tempo que eu ouço um determinado programa, sou consciente de que outros ouvintes estão sintonizados no mesmo programa. Metaforicamente, é como se estivéssemos conectados com os outros ouvintes por meio de um fio invisível, o qual nos faz sentir em sintonia uns com os outros. A rádio que nos acompanha - no dia a dia - nos faz companhia nos momentos de solidão e nos proporciona uma sonoridade que preenche o vazio dos nossos espaços domésticos, de trabalhos etc., agregando-nos a uma comunidade sonora da qual nos sentimos parte, quando estamos “em sintonia”.
Não obstante isso, a dimensão social que a rádio via internet vem nos proporcionando, cria uma nova percepção do fluxo sonoro, possibilitando assim personalizar a programação a partir das preferências musicais de cada ouvinte, que vai desde a interação social na transmissão ao vivo até os áudios sonoros que ficam arquivados no homepage da própria emissora, e que ficam à disposição dos seus usuários. A internet, portanto, possibilita a personalização do fluxo sonoro.
As modalidades dos serviços radiofônicos, frutos desta convergência digital, têm como finalidade fundamental viabilizar aos “web ouvintes” e aos “radiouvintes” uma possibilidade maior de receber ou escolher à informação sonora em modalidades diversas ou interagir com os locutores ou diretores dos vários programas ao vivo ou disponíveis em arquivos de áudio no site da emissora de rádio. Esta dinâmica de transmissão, leva-nos a refletir sobre um novo modelo radiofônico que se ergue com o advento da interatividade na rede telemática. Segundo Menduni (2006:16) “[...] O modelo broadcasting, caracterizado por uma transmissão um-a-muitos, divide espaço com o modelo multicasting, isto é, o modelo interpessoal, transmissão um-a-um e muitos-a-muitos.”. Não podemos ignorar que, a interatividade na rádio, que desencadeou novas formas de linguagem, teve início com o uso do telefone, por parte dos ouvintes, nas participações ao vivo, por exemplo: através dos pedidos de músicas ou dos seus “alôs”.